quinta-feira, 28 de junho de 2007

Adeus Saudade...


Portugal. Nome de um país que sempre associara aos "fazendeiros", no Congo (meu país de origem), e aos comerciantes, assim como armazens de grande porte, sem esquecer nunca a foto da visita de Mário Soares ao meu (tio-avô) Presidente, Mobutu Sese Seko. O país que me viu chegar (a mim e ao meu irmãozinho, Roy - ver foto do post anterior) com doze anos de idade.

A minha vinda a Portugal não se deveu a nenhuma vontade especial, confesso, mas a uma necessidade urgente de "fugir" do Congo, por razões escolares. Estudávamos (eu e o meu irmão) num colégio jesuita, onde o nível de excelência primava entre muitas outras instituições de ensino em todo o território congolês, contudo, por razões de sucessivos greves, por parte de diversas organizações sindicais (comunistas), acabamos por perder o precioso tempo de aprendizagem, donde, tenha sido imperativa uma deslocação para o estrangeiro - mal se sabia do caos que se viria a instalar em todo o universo escolar... - , para assim podermos continuar os estudos.

Mas, porquê Portugal, e não a França ou a Bélgica (por razões culturais óbvias)?

Acontece que o meu pai se encontrava em missão prolongada em Lisboa, como Primeiro Conselheiro e Ministro Plenipotenciário, na Embaixada da então República do Zaire (hoje República Democrática do Congo), daí que fizesse mais sentido vir estudar na terra dos três "F´s" (Fado - Futebol - Fátima).

Uma vez em casa, muito mais do que o "medo" ou a angústia de não saber falar a língua de Camões, era o medo e a angústia de chamar "Pai" a um senhor que nunca me viu crescer, nem sorrir. O senhor, meu pai, impávido, altivo e distante, como sempre ouvi falar, olhava-nos atentamente, como quem tinha momentos de dúvida se algo lhe pertencia verdadeiramente. Enfim, reacção normal de um pai de vinte filhos (perdão, vinte e um, segundo as pesquisas mais recentes).

Durante os meus primeiros três anos, os sonhos, o pensamento e o coração ainda residiam na rua onde sempre andei até conhecer a minha pessoa, o meu território, a minha terra, o Congo. Foram tempos de difíceis adaptação, a nível familiar, e num sentido mais alargado da sociabilidade. Era a saudade a falar mais alto do que a razão. Um verdadeiro "desterrado".

Porém, algo me chamava a atenção nesta terra em que me tornei "homem". Algo místico que me embalsava a alma, nos momentos mais tenebrosos que a saudade suscitava. Falo de uma prometida ida à Fátima, para uma visita ao lugar onde a Senhora aparecera aos pastorinhos. Não sei dizer se se tratava de uma beatice ou santidade da alma, porque nem tinha juízo para tal discernimento. Mas o que é certo é que, o filme que a senhora, minha mae, me oferecera em criança ("para aguçar o gosto e o interesse ao sacerdócio") sobre a vida das três criançinhas da Cova da Iria me tinha ficado na mente, como que um consolo, um sinal de esperança e perseverança.

Curiosamente, no dia em que a promessa se concretizara, após um momento de deslumbramento perante a imensidão de peregrinos, acorrendo aos pés de Nossa Senhora de Fátima, algo em mim mudou, a saudade amainou, e o coração sossegou-me a alma sedenta de um regresso à minha terra natal. Foi como que uma consciencialização ou de uma assunpção pela própria realidade com que me deparara.

(Continua...)

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Tudo começou...





Tudo começou no aeroporto da Portela, em meados de Agosto do ano de 1994, quando, pela primeira vez pisei o solo português. Terras de Camões, de Bocage, de Pessoa, e (segundo o que me ocorria nessa altura) de Mário Soares.

Ao descer do avião, ocorreram-me várias cenas na imaginação, ainda de recém criança, com 12 anos de idade, nomeadamente, de beijar a terra pisada pelos meus antepassados, filhos do Imperador Kongo, a convite de D. Manuel I, Rei de Portugal. Mas tal não sucedeu, pois todos acorriam aos autocarros que nos esperavam já na pista. O meu irmão estava aflito, pois tinha aguentado umas valentes horas sem urinar (milagre!).

Enfim, vi, pela primeira vez o meu pai, com olhos de ver...

Era o início de uma longa viagem que, só agora começa a findar.

(Continua...).